A grande Onda 
"A Grande Onda Kanagawa" de Katsushika Hokusai, c. 1829-1832
Não faz muito tempo que o Japão está integrado ao mundo ocidental. Até o início do século XIX  vinha separado do resto do mundo, havia há uns duzentos anos, até que os Estados Unidos forçaram-no a entrar no mundo ocidental.
A xilografia “A grande onda” mostra um pouco dessa ideia que tínhamos do Japão como um povo que ficava à parte do Ocidente.
A obra foi feita pelo artista Hokusai e faz parte de uma série de "36 vistas do monte Fuji". É uma bela onda, com profundo azul, que se encrespa acima do mar. Ao longe vemos o elegante Monte Fuji com seu pico coberto de neve. Se formos mais atentos, veremos três barcos de pescadores  prestes a serem engolidos pela fúria do mar. A margem está longe, fora do alcance dos assustados pescadores. Uma aflição de alto mar nos invade e ao invés de ser um plácido desenho de natureza, típico japonês, acaba por ser uma imagem de incerteza e perigo. Parece que o artista pressente o momento mesmo em que  os Estados Unidos logo tirariam o Japão de seu estado de contemplação e o forçariam a entrar na turbulência ocidental.
Era o início da industrialização e novos consumidores estavam sendo avidamente detectados tanto pelos Estados Unidos como pela Inglaterra. O Japão seria um importante mercado a ser conquistado.

 Desde 1630  o país vivia isolado. Ninguém entrava e ninguém saía. Não havia missionário ou comerciante que não fosse perseguido até deixar as terras japonesas. Os cidadãos japoneses, por sua vez, estavam proibidos de sair do seu país. O único porto (aberto somente para o comércio com a Holanda e com a China) era Nagasaki. Com altas restrições. Assim, não entravam estrangeiros mas entravam produtos do resto do mundo.
“A grande onda” nos mostra isso, pois  era impressa com papel de amoreira japonês, mas o azul era pintado com tinta alemã: o azul da Prússia ou azul de Berlim. Tinta essa que não desbotava com facilidade. Era importada através dos holandeses ou talvez dos chineses “mais provável da China onde vinha sendo manufaturada desde a década de 1820” diz Neil MacGregor , autor de “a História do Mundo em 100 Objetos” de onde estas informações foram tiradas.  “A grande Onda” possui o azul da cor que todos gostavam, tanto europeus quanto japoneses.
“Hokusai foi buscar no Ocidente mais do que as cores- tomou emprestadas também as convenções da perspectiva europeia. Fica evidente que  deve ter estudado as gravuras europeias importadas e introduzidas no Japão pelos holandeses, que circulavam entre artistas e colecionadores” conta McGregor.
“A Grande Onda” tem portanto uma técnica europeia com a sensibilidade japonesa. Daí porque caiu de imediato no gosto europeu ao mesmo tempo que no japonês. O exótico estava ali na medida certa.
A obra, no entanto, era uma metáfora, um símbolo do sentimento japonês da época, prestes a deixar o conforto do isolamento e estabilidade para ir se aventurar para muito além. Tudo era uma espécie de ameaça para este povo que tinha rígidas leis de comportamento controladas com nada mais, nada menos do que a pena de morte. Mas, eles sabiam dos seus limites e de sua segurança. Agora abria-se o mundo à força pelos americanos que vieram sem ser convidados.
A série  teve, no mínimo, 5000 cópias e o preço era muito barato (equivalente a um prato de macarrão, diz McGregor) e visto assim era bem rentável cada uma das cópias da série de 36.
O Japão acabou por entender que não poderia ser uma ilha e entrou de cabeça no sistema econômico mundial. Ocidentalizou-se. A partir de 1853 as gravuras japonesas começaram a invadir a Europa. Sabemos o quanto a moda pegou através das obras de grandes pintores como os impressionistas. Van Gogh, por exemplo, que amava os delicados papeis japoneses e tudo o mais que vinha do Japão.
Vemos assim, como um influenciou o outro. “A Grande Onda”, porém, ficou em nosso imaginário como símbolo do Japão puro, isolado, eterno.
 Angela Weingärtner Becker

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