Michelângelo e o Neoplatonismo 


Do século XIV para a frente, a pintura toma muita força comparada com a escultura.Talvez por esta última mexer diretamente com a matéria, o artista, no meio do pó e entre ferramentas bem mais “primitivas” do que o pincel e tintas, se assemelhava aos trabalhos artesanais.

 Mas havia um escultor que mudou este conceito e praticamente sozinho elevou a escultura à categoria de arte nobre. Ele se considerava mais escultor do que pintor, embora tenha feito de forma magnânima a capela sistina: Michelângelo Buonarroti. E realmente chega ao apogeu da História da Arte como se pode perceber em Vasari que o trata como um marco, quando diz “de Cimabue à Michelângelo...”.
Michelângelo nasce em família aristocrática, em Florença, 1475. Ghirlandaio será seu primeiro mestre e Bertoldo di Giovanni, escultor e medalhista, participará de sua formação bem como Donatello. Este último de tal maneira, que se disse “ou a alma de Michelângelo opera em Donatello ou a alma de Donatello opera em Miquelângelo”. Outros artistas tiveram influência sobre Michelângelo tais como Jacopo della Quércia, principalmente no que concerne à capela sistina, nas figuras serpentinadas, em forma de “S”, ou em forma de labareda. Outro escultor, de Bologna, cuja obra é muito especial e cheia de dramaticidade (feita em terracota) chamado Nicollò dell’Arca, também teve uma certa influência sobre o mestre, embora se diga que “Michelângelo não foi aluno de ninguém”, tal a sua originalidade pois até a Antiguidade como modelo, fica em crise diante deste gênio. André Chastel , historiador de Arte, resume a questão dizendo que a Antiguidade aparece como um cosmos histórico. Porém a busca do original, em Michelângelo, é tão acirrada que a Arte Moderna pode ter nele o seu embrião.
Escravo despertando
 Michelângelo tem sua ligação maior com o neoplatonismo florentino e, a certa altura, segundo o professor Rodrigo Naves, passa a ter um escopo filófico de pensamentos praticamente poéticos. Michelângelo também passa pela palavra pois tem poemas de alto valor estético.

Lorenzo de Medici interessa-se pelo neoplatonismo que em Florença, no lugar das “Idéias” de Platão, colocam Deus como "a" fonte luminosa. A separação da matéria e a luz é radical. Com Policiano, mestre e pedagogo da família Medici (e que vive na casa dos Medici como um igual, à semelhança de Michelângelo). Eles, na companhia de grandes humanistas, discutiam o neoplatonismo  enquanto passeavam no Jardim das Esculturas (quase como na polis grega) que Lorenzo organizou com fragmentos de esculturas clássicas. Isto traz  a Michelângelo um sólido fundamento filosófico neoplatônico que é unanimemente reconhecido pelos especialistas em suas esculturas. Em Davi, todos os cânones antigos estão realizados, luz e matéria, luz e sombra.(Michelângelo o faz com 26 anos!!!). Nele há um alívio das tensões onde Davi parece estar tenso e relaxado ao mesmo tempo. Sembre a ambiguidade, sempre a matéria e o espírito presentes, em contínuo debate.
 Piedade Rondanini-detalhe


O historiador Argan nos fala do “non finito” e o “troppo finito” na escultura de Michelângelo.O primeiro, non finito,seriam partes deixadas propositalmente inacabadas, sem trabalho refinado, deixadas  com superfície rugosa ou com os sinais do cinzel. Partes que absorvem a luz, tornando-as opacas. O troppo finito são as partes da escultura (como a Pietá de São Pedro)em que Michelângelo polia o mármore ao ponto deste brilhar com a luz, procedimento coerente com o conceito neoplatônico, de retirar do bloco de mármore, a Idéia. Em “os escravos” Michelângelo realiza o non finito de uma forma magistral. O Escravo Rebelde se contorce em esforço para sair da matéria onde a luz é aprisionada. Já no Escravo Moribundo, a luz transcedental o relaxa.Estavam previstas 20 figuras de escravos, mas os trabalhos foram suspensos por Julio II.

Prisioneiro jovem
O mundo sensível, nos trabalhos neoplatônicos, sempre são vistos do ponto de vista negativo. Platão execrava as artes que seriam a imitação da imitação do mundo material, já "falso" por si mesmo. Os neoplatônicos vão resolver esta questão quando decidem que as artes vão corrigir o mundo sensível e portanto ficar mais perto da “Idéia” perfeita de Platão. Os artistas não imitam, mas corrigem. Como se este, como um deus, insuflasse o espírito no trabalho artístico. Assim o conceito de “furor” do artista (hoje chamamos de inspiração) operaria de dentro para fora como um deus criador. “As formas emergem da pedra como se saíssem da água” disse um historiador. E de fato assim parece nos Escravos de Michelângelo que mantém a tensão entre ser forma e ser matéria. “O grande artista não obedece”diz Michelângelo que só trabalhava sozinho. Sozinho vai buscar seu mármore e usa um bloco único pois nele (e só ele) continha a Idéia, o espírito. Então trabalhava substraindo matéria como se a figura já estava lá dentro.

Um pensador diz que Michelângelo é sobretudo e além de qualquer filosofia, o autor da tragédia humana. 
 Angela weingärtner Becker

.......estava em Florença a principal comércio da Itália na época. Em consequência da indústria, comércio e dos bancos desenvolveu-se o cálculo e uma visão racional da realidade chegando a uma profunda plenitude intelectual de visão humanista e ideológica

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