ODILON REDON (1840-1916)
“Se a arte do artista é a canção da vida, uma melodia grave
ou triste, devo ter soado a nota da alegria em cores.” (Odilon Redon).
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Alegria, sonho, mas também pesadelos. Basta dizer que usou a
cor preta, e somente ela, por um bom tempo. "Mestre da doença e do delírio"
disse alguém, pois flerta com o sinistro. No entanto, a alegria vence no final.
Aliás, torna-se iridescente!
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Ontem vi mais de seiscentas obras de Odilon Redon, com fundo
musical de Chopin, a Marcha Fúnebre. Uma overdose de luz, uma overdose de
sombra. Não tivesse gostado, não teria ficado mais de hora aqui:
https://www.youtube.com/watch?v=xiTxw02d6s0 .
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Nunca vi alguém trabalhar a cor com contrastes tão resplandecentes.
Ele opera numa osmose entre o mundo subjetivo e o objetivo. Isso se dá em continuidade, aparentemente por
pura maestria do uso da cor. Ficamos encantados com estas imagens que se erguem
das profundezas, de um lugar desconhecido. A cor vem em ecos como transmutação
secreta e misteriosa. O invisível está ali mesmo na tela, na aparência das
coisas. Não é o signo, mas as coisas mesmas. É o famoso “sublime” tão caro ao
romantismo. Foi Influenciado por Gustave Doré, Goya, Allan Poe, Georges Seurat,
Goethe. É fácil de ver nas telas, estas influências.
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“O simbolismo
antecipa a concepção surrealista” diz Argan, meu historiador de arte favorito.
O sonho é visto como revelação da
realidade profunda do ser. Diferente do impressionismo que o antecede que quer
a cor tecnológica e científica, a cor no lugar em que a razão construiu seu
sistema. Aqui há uma contínua aspiração da transcendência. A pintura deve ser
poética e musical. A inspiração do artista não provém da ciência nem do alto,
mas emana da vida.
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Até 1886, Odilon passa um longo período só desenhando e
usando o preto. Até que, arrebatado como num êxtase, se abre em visões
oníricas. Agora pinta uma realidade infinitamente mais vasta do que os sentidos
captam. Ele passa da análise para a síntese, do desenho minucioso às grandes
manchas de cor. Timbres e vaporosas vibrações com perfumes e sons, acompanham
as cores. Busca continuadamente o ritmo
de uma transmutação secreta. Tipo... ele não inventa, ele revela.
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O brilhante pintor e escuro gravurista Bertrand Redon,
apelidado por sua mãe Odile, de Odilon Redon, nasceu em Bordeaux, França.
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Aos 15 anos começa desenhar. O pai o queria arquiteto, mas
ele é reprovado na Escola de Belas Artes de Paris. (Outra vez os salões
recusando excelentes artistas!)
Trabalha com carvão e litografia, como forma de ganhar a
vida “já havia tentado, em vão, mostrar nos Salões oficiais os inúmeros
desenhos que já havia feito. Portanto, fiz minhas primeiras litografias para
multiplicar meus desenhos.”
Volta para Bordeaux onde aprende escultura e outras
modalidades de artes visuais, como a gravura. Vai servir na guerra franco-prussiana
e depois se muda para Paris.
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Conhece Stéphane Mallarmé, poeta e crítico de arte.
Participa de reuniões regulares em sua casa. Lá encontra Gauguin, Vuillard,
Whistler além de outros literatos. Conhece também o romancista e colecionador
de arte, Joris-Karl Huysmans que escrevera um romance de sucesso cujo
protagonista tem a excentricidade de colecionar desenhos à carvão de Odilon
Redon. Essa amizade ajudou-o a se tornar famoso.
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Em 1880 casa-se com
Camille Falte: “Creio que o sim que pronunciei no dia da nossa união foi a
expressão da certeza mais completa e absoluta que alguma vez experimentei. Uma
certeza ainda mais completa do que a minha vocação”. Mas esta felicidade logo é
perturbada pela perda, aos seis meses de vida, de seu primeiro filho. Odilon
Redon mergulha em profunda depressão.
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Na última coletiva dos impressionistas (1886) Odilon Redon
expõe suas obras. O impacto dos “noirs” de Redon na arte moderna será muito
importante. Os surrealistas ficaram particularmente impressionados com a
qualidade onírica daqueles carvões e litografias, e André Breton foi um
admirador particularmente grande.
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Em 1890, seu trabalho sofre uma mudança radical. Agora o
foco era a ênfase na subjetividade e na visão interior. Finalmente emprega cores após anos de apenas preto.
Neste momento, houve um despertar religioso com seu crescente interesse em
assuntos do budismo e cristianismo. Sua preocupação principal era com a
experiência subjetiva da espiritualidade e não a mera ilustração de textos
litúrgicos. A cor se tornou um meio potente para explorar espaços além do
visível. (há quem atribui esta adoção da cor à sua felicidade pessoal, já que
seu segundo filho havia nascido).
Tudo o que passou a produzir, seres mitológicos e literários,
naturezas mortas florais foi totalmente inundado com cores brilhantes. Em vez
de descrever as coisas para nós, o espectador participa ativamente da
interpretação da obra. A obra fica absolutamente brilhante. Ele faz uma
condensação na tela do adejar de toques e de gestos iridescentes.
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Marcel Duchamp, observou: “Se devo contar como foi minha
própria partida, devo dizer que foi a arte de Odilon Redon”.
A fama de Redon cresceu no final de sua vida. Em 1903, o
governo francês concedeu-lhe a Legião de Honra. Em 1913, é publicado um
catálogo com suas gravuras. Neste mesmo ano, ele foi incluído no famoso Armory
Show, em Nova York, exibindo mais obras do que qualquer outro artista na
exposição.
Odilon Redon faleceu em 6 de julho de 1916, talvez uma morte
acelerada por sua ansiedade e pavor em relação ao filho, que servia como
soldado na linha de frente na Primeira Guerra Mundial.