“BACON: A BELEZA DA CARNE”


                                               Duas Figuras, 1953

(Texto feito a partir de palestras que podem ser acessadas no site do Masp)
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é uma importante exposição que está ocorrendo no MASP (22-3 /28-7). pois as pinturas de Bacon sao raras, valiosíssimas, e os museus nao gostam muito de emprestá-las, diz Paulo Hekernhoff.
Aqui trata-se das obras de Francis Bacon do período 1947-1988.
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O subtítulo (a beleza da carne) vem de uma fala do artista em entrevista de 1966 qdo Bacon expressa sua admiração pela impactante visão das peças de carnes penduradas em um açougue. Beleza e horror, emergem como dualidade em sua obra bem como sedução e destruição, vida e morte.
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Nos últimos 20 anos surgiram muitas pesquisas interessantes sobre o pintor. O status jurídico da sexualidade mudou e muita coisa nova veio à tona sobre a biografia do autor.
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Principalmente nos últimos10 anos, temos um desvelamento da obra de Bacon com a emergência de assuntos queer, assunto esse, que na sua obra ocupa um lugar central uma vez que era essa a sua identidade com uma forma muito particular de ser. Ele encontrou um fazer profundo dentro dessas estruturas de violências e desigualdades.
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As 23 obras expostas vêm trazer a história queer ignorada na pesquisa de Bacon o que torna a exposição pioneira, isto é, pela primeira vez o assunto é densamente abordado.
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Bacon se estabeleceu no Soho (anos 50) um bairro central de Londres, com becos interconectados, comunidades artísticas, imigrantes do pós-guerra. Lá viviam pessoas de todo o tipo, uma enorme diversidade, inclusive os fora da lei.
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O que é um queer ? (queer= ‘estranho’ pessoas que não se identificam com os padrões impostos pela sociedade e transitam entre gênero sem concordar com os rótulos ou que não sabem definir seu gênero/orientação sexual). A exposição do MASP destaca este aspecto queer e escolhe este pintor que vive esta vida na época em que nem era usada a palavra homossexual, sequer gay era usada.
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Havia muitas mudanças neste pós guerra, o fim do racionamento de guerra, mudanças políticas, sociais, novas ideologias, velhas repressões. O Soho pela sua diversidade era um bairro conhecido como “o que não se podia policiar”. No entanto, a polícia vasculhava tudo em busca de sinais de prática sexual ilícita. A pena era prisão e posterior castração química (ver o caso de Allan Turing, o grande matemático que cometeu suicídio em decorrência dessa situação).
Há números sobre esta perseguição sexual. No ano de 1952 houve 670 processos por sodomia e 3087 casos de atentado ao pudor. A polícia vasculhava buscava até maquilagem e trejeitos em fotografias para encontrar sinais de homossexualidade. Os escândalos e práticas sexuais eram divulgados pela mídia.
Bacon estava profundamente mergulhado nesta época delirante e principalmente dentro da minoria queer.
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Os anos 50 foram de grande agitação e ansiedades. Havia um jeito de maior liberdade sexual para os queer com dinheiro: fugir para Berlim, Monte Carlo, Egito, mas principalmente para Tanger onde a polícia fazia olho grosso para o turismo sexual, drogas e prostituição (que eram lá tb proibidas, mas não fiscalizadas).
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Bacon e outros homens ricos e intelectuais como os escritores William S. Burroughs, Tennessee Williams, Allen Ginsberg, frequentavam cafés, clubes, passeios juntamente com jovens americanos, árabes, marroquinos já que eram homens queer exilados também dentro de seu próprio país e vinham para escapar da repressão.
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Assim se transformavam no “cosmopolita gay”, isto é, alguém do país, fora da lei, que encontra um parceiro no estrangeiro. É assim que Bacon tem um relacionamento com Peter Lacy definido mais tarde por Bacon como “quatro anos de horror contínuo” . O amante destruiu quase toda a sua obra em Tanger, num ataque de raiva.
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É importante este estudo do contexto de Bacon não só em Londres, Soho, mas tb nos vários países que costumava visitar. A maior parte de sua vida Bacon não estava pintando. Estava viajando, amando, vivendo. Temos medo, às vezes de focar nesses detalhes mas são eles que compõem a visão de mundo do artista.
(Texto baseado nas palestras promovidas pelo MASP: Gregory Salter; Dominic Janes; Richard Hurnsey e outros)

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