Caravaggio (1571-1610)
Poucas são as revoluções na Arte, tão explícitas quanto a de Caravaggio. “É a revolução mais notável de toda a arte italiana” diz André Chastel, historiador de Arte. Temperamentos como o de Caravaggio, não são raros no mundo das artes. Mas a ele acrescente-se o acaso e o povo (no caso a ralé de Roma) para compreeender seu sucesso e fim trágicos.
Medusa
Michelangelo Merisi nasce em 1571, no povoado de Caravaggio, nome que depois adota. Chega a Roma em 1588 e logo se envolve em desavenças com a polícia, rixas, atentado aos costumes.
Tinha que pintar “três cabeças por dia” em troca de um prato de comida. Em 1596 foi descoberto pelo cardeal Francesco Maria Del Monte que lhe deu teto, comida, vinho e dinheiro. Para ele, que era chegado a jovens seminus, Caravaggio pintou um Baco enfeitado de flores, muitos jovens e delicados anjos. O cardeal era “aficcionado pela companhia de jovens” conforme Rose e Rainer Hagen na obra “Los secretos de las obras de Arte”.
Baco
Logo Caravaggio se torna famoso. No entanto era difícil sua adaptação aos eclesiásticos e palacianos. Ele não mantinha “a dignidade e aristocracia” preconizadas pelo Concílio de Trento. Pintava os santos com pés sujos e a Virgem Maria morta (o modelo foi uma prostituta afogada, inchada e amarelada) sem o famoso “decoro” cristão e sim com o humanismo e naturalismo absolutamente profanos. Era um escândalo só.
Em 1598/99 recebe um trabalho importante: a decoração da capela abandonada perto do palácio do dito cardeal. Em "Judite e Holofernes" pinta o instante exato da decapitação. Vê-se na pintura a cabeça separada do corpo parecendo ainda ter vida. “Os olhos expressam o terror e da boca entreaberta escapa o som de um grito” dizem os autores citados.
Em 1598/99 recebe um trabalho importante: a decoração da capela abandonada perto do palácio do dito cardeal. Em "Judite e Holofernes" pinta o instante exato da decapitação. Vê-se na pintura a cabeça separada do corpo parecendo ainda ter vida. “Os olhos expressam o terror e da boca entreaberta escapa o som de um grito” dizem os autores citados.
David
Shakespeare (seu contemporâneo) tinha a mesma teatralidade mostrada em Macbeth, por exemplo. Tanto na Inglaterra como em Roma, as cenas de tortura e morte estavam no cotidiano. “Há mais cabeças degoladas na ponte de Santo Angelo (Roma) do que melões no mercado”. Numa espécie de gazeta manuscrita da cidade lia-se: “os bandidos são donos do país, matam roubam e devastam as cidades e as casas”. O Vaticano era aterrorizado por salteadores armados até os dentes. A decapitação era reservada à nobreza e feita de forma macabra: a cabeça era exposta ao público sobre um pano preto, entre duas velas acesas. Um manual da época dizia que os pintores eram convidados a acompanhar e estudar as execuções e é provável que Caravaggio fazia parte destes “alunos”. Testemunhar estas mortes e a derradeira dramaticidade da agonia, certamente fascinavam o pintor que estava trabalhando em “O sacrifício de Isaac”, “Judite e Holofernes” e “A decapitação de São João Batista”. Sem contar os outros dois quadros em que aparecem as cabeças de Batista e a de Golias.
Judite e Holofernes(detalhe)
Muitos não compreendiam(como até hoje acontece com os que querem na Arte apenas o “bonitinho, o bonzinho”). Seus modelos, nada tradicionais, eram buscados na rua, pele enrugada, mãos marcadas pelo trabalho. A Virgem que recebe as homenagens dos peregrinos é uma solícita matrona romana, uma dona de casa. O Cristo de “Os peregrinos de Emaús” é um homem comum, quase feio, sem idealização alguma. E assim, considerado demasiadamente cru e dramático, poderia ter criado.“...um certo renascimento do pensamento franciscano, como uma nova Bíblia dos pobres”(CHASTEL).
O Sacrifício de Isaac
Na verdade ele exortava a arte sacra para mais humanidade. Tinha horror ao maneirismo de Michelângelo, que com sua arte convencional, esterilizava a realidade. Caravaggio, como se tivesse em mãos uma luz de holofote, retira as figuras de um fundo absolutamente negro e traz a cena para a nossa frente. Parece que um spot ilumina os primeiros planos. A cada quadro um susto, pela dramaticidade que puxa o espectador para dentro. O movimento, o naturalismo, a luz, fazem um Caravaggio cinematográfico. Ele fará escola: o caravaggismo. Atuou por pouco tempo, 10 anos, e como uma faca que corta em dois, acontece de a pintura ser divida em antes e depois de Caravaggio.
A morte da Virgem
Em 1606, fere de morte um tal de Ranuccio Tomassoni, numa aposta de jogo de bola. Esta não foi a única denúncia sobre ele. Os arquivos romanos contabilizaram outras mais. Carregava sempre uma espada na cintura e em sua obra aparecem muitos tipos de adagas, espadas, facas, armas. Ter o direito de levar uma arma consigo, era privilégio da nobreza. Caravaggio era de uma classe inferior e isso o irritava. Depois da agressão e morte em que se envolveu, foi cada vez mais recusado pela Igreja e pelo Estado. Ele abandona Roma e morre de malária já no caminho do exílio, atormentado e sofrendo de mania de perseguição. Tinha 38 anos de idade.
Sua maestria e genialidade, no entanto, são imitadas e se tornariam decisivas para o desenvolvimento da pintura do século XVII.
Angela Weingärtner Becker
Nenhum comentário:
Postar um comentário