Museu Thyssen, Madri (Parte 1)
O taxi-van deslizou os 13 km até o centro de Madri, para um hotel simples, honesto e bem localizado.
As malas no hotel, o banho para acordar e umas tapas para sustentar no mínimo umas quatro horas de Thyssen-Bornemisza. Este, junto com o Prado e o Reina Sofia, fazem parte do “Paseo del Arte”, no centro de Madri.
Chegando ao Museu, pude ver as lindas árvores cujas copas quase fechavam o céu, naquele dia azul-maravilhoso. Árvores de troncos centenários. Imediatamente minha imaginação viu a linda Baronesa Carmen Thyssen, amarrada a um deles. Foi o que fez, no ano de 2007, em protesto pela derrubada das árvores, quando da remodelação do espaço. A viúva do Barão Hans Thyssen- Bornemisza, Carmen (Tita), Miss Espanha em 1961, e ex do ator Lex Baker (que fazia o Tarzan) com chapéu e correntes, parecia saída de um filme de Almodóvar.
A Baronesa Thyssen na concentração SOS “Paseo del Prado”
(Foto: Javi Martínez, 2007/05/07)
Mas polêmicas aristocráticas à parte, ela está ligada à maior coleção privada de arte do mundo. Com 715 obras no Palácio Villahermosa. O restante encontra-se no Museu Nacional d'Art de Catalunya, em Barcelona.Em 1992 estavam emprestadas ao governo espanhol. Um ano depois foram doadas em definitivo.
Atravessei o pátio central coberto e amplo. Fui ao segundo piso para ver as obras do século XIV e XV. Eu veria, então, “os primitivos italianos” depois os góticos neerlandeses (países baixos) a pintura conhecida como bizantina. Figuras de frente, sobre um fundo plano e dourado. E sempre figuras sagradas. Mais tarde, a representação de uma história teria um cenário que o espectador reconheceria por ser familiarizado com os Evangelhos. Isto já com a luz da Renascença no fim do túnel.
Na primeira sala, imagens planas, chapadas como figuras de baralho. Sempre as mesmas imagens: Virgens esquematizadas, petrificadas, segurando um Jesus-menino, com rosto de adulto. Crucificações, Descidas da Cruz, Cristos pantocrátor (o todo-poderoso, que abençoa). E ouro no fundo: símbolo de um mundo acima do físico. Ah, pensei: aqui estão as regras impostas pelo imperador Constantino. Ele sabia que tornar-se cristão era um bom negócio político. Converteu-se. Uniu poder com religião. Então fundiu o cristianismo com a arte grega, pagã.
Naquela época o artista era artesão e não artista como entendemos hoje. Enquanto pintava, rezava ou cantava cantos religiosos. Um artesão anônimo, perfeito seguidor de regras. Mas nem por isso deixava de ter encantos e delicadezas. Num vapt podia me transportar para um mosteiro. Um cheiro de incenso, o pecado, as autoflagelações, poções mágicas, relíquias e relicários. O filme "O nome da Rosa" baseado no livro de Humberto Eco, desfilava inteiro por ali.
"Tríptico da Virgem com o Menino" 1300-1310
Depois, passei para os neerlandeses (países baixos) com sua pintura cheia de detalhes. Aqui, já há uma certa autoria. Uma certa perspectiva. Em 1390 nasce o pai mítico da pintura neerlandesa: Jan Van Eyck. Este, que pintou o casal Arnolfini (National Gallery, Londres). Esta imagem, por muito tempo vi pendurada no quarto do meu filho, atraído pela sua notável perfeição. Não é para menos que é considerado o mais célebre primitivo flamengo. Que de primitivo, não tem nada, penso eu. Basta ver este díptico de La anunciación. É uma pintura, não escultura, como parece. Conseguiu este volume, esta profundidade, me diz como?! Pode-se ver a pedra, que coisa! Pois, é uma pintura, sim senhor. Pintura a óleo. Nem peço que acreditem em mim. É ir lá. Olhar para crer.
"Díptico da Anunciação." Jan van Eyck-1435-41
Os irmãos van Eyck são os inventores da tinta a óleo. A pintura seca devagar permite retoques, recebe veladuras, pode ser pintada em tela, enrolada e transportada. Trazida através dos Alpes. E, do lado de cá, fazer trocas técnicas importantes.
Alonguei-me nesta ala dos primitivos. Mas como fazer a carruagem andar neste museu carregado de grande número de obras importantes de cada fase da história? E de obras importantes dentro da história de cada artista em particular? São mais de 700 obras, e de obras escolhidas a dedo. O Barão Heinrich e seu filho Hans tinham, além de dinheiro, um feeling, uma consciência subjetiva, capaz de acertar quase sempre. Eu diria sempre! Muito grata, Barão e Baronesa. Esta, com inteligência e sensibilidade soube acrescentar em 2004, mais 200 esculturas e pinturas de sua coleção. A visita tinha apenas começado. Eu já transbordava de emoção.
Angela Weingärtner Becker
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